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sexta-feira, 7 de julho de 2017

JÚLIO, UM “PEQUENINO” DE CRISTO



Júlio é um homem matuto, cabra macho e pernambucano, e que atualmente reside em Goiânia, GO. Homem sem estudos, com semblante sofrido, com marcas do sol em sua pele. O encontrei subindo com seu carrinho de coletar reciclagens com um fogão velho de quatro bocas, um colchão de casal e mais algumas coisinhas fundamentais para sobreviver bem em uma casa de dois ou três cômodos. A subida era tão íngreme que ele dava passos curtos, afadigado e extremamente molhado de suor. Me comovi com aquela cena e tive que parar. Desci de minha bicicleta, a segurei com a mão esquerda, e sem pedir peguei com a mão direita no puxador do carrinho de Júlio, onde ele segurava forte, e empurrei com toda a minha força. Já estava cansado do meu passei ciclístico, mas naquele momento ao ver a força de Júlio, e a dedicação em subir carregando aquele imenso carrinho, tirei forças de onde nem imaginava existir, e empurrei. De ali em diante eu tive uma longa conversa com aquele “cabra”, onde ele contou toda a sua história. Foi um passeio tão bom — apesar da imensa força que estávamos fazendo — que nem vi a hora passar, e caminhamos por um considerável trajeto até chegar na sua casa.

Resumindo nossa conversa, Júlio é um homem que não teve oportunidade de ter um bom estudo, pois teve que trabalhar na roça desde pequeno. Sua vida sempre foi de um empregado, e que precisava acordar cedo e dormir tarde para ter o seu pão. Pela falta de estudo nunca teve oportunidade de crescer na vida — digo no sentido de conseguir um emprego melhor, com boa remuneração. Ele tem esposa, filhos e netos. Todos trabalhadores, com carteira assinada e homens honestos e justos. Júlio veio para Goiânia atrás de emprego, mas enquanto não consegue, trabalha como coletor de reciclagens. Não é usuário de drogas, e nunca precisou usar de meios ilícitos para sobreviver e ter o pão na sua mesa. Disse preferir “ver a família chorar do fome diante da mesa sem nada para comer, do que ver a família sorrindo com a mesa farta, mas saber que aquele alimento é fruto de desonestidade”. Logo, em meu coração, senti o desejo de pegar o dinheiro que estava no meu bolso — o dinheiro de pagar as minhas contas — e entregar a ele, mas desisti quando ele disse que algo em que se orgulha é de nunca ter de pedir nada a ninguém, pois Deus sempre lhe deu saúde, força e oportunidade para trabalhar. Ele sorria quando me via afadigado de tanto fazer força puxando aquele carrinho com ele; dizia que era para mim pensar para o lado bom: eu estava me exercitando e adquirindo saúde.

Em toda a caminhada ele só reclamou de uma única coisa: da sua dor nos dentes. Quando olhei para o seu sorriso, haviam poucos dentes, todos apodrecidos e pelas metades. Meu coração partiu! Pois eu tinha um plano odontológico, e o usei poucas vezes, enquanto ele, um homem cheio de problemas dentários não tinha condições de pagar por um. Eu perguntei o que ele fazia quando as dores chegavam, e ele me respondeu: Tomo água e choro de dor! E sorriu sem graça. Mas imediatamente mudou de assunto, temendo que eu imaginasse que ele estava pedindo algo. Então no fim do percurso ele me disse que fica muito feliz de ver pessoas boas no mundo, que se importa com os menos favorecidos, e eu respondi que eu sigo a Cristo, e Ele ensina que devemos amar as pessoas como Ele as amou; imediatamente Júlio tirou o boné, colocou a mão no peito e disse: Deus é maravilhoso! O nosso Pai, que nos ama!

Ao despedir, fixei e decorei seu endereço em minha mente, para que eu pudesse voltar lá e construir uma amizade com um homem que valha a pena. Dei meu endereço e disse que ficaria feliz se ele fosse me visitar. Ele sorriu e disse o mesmo.

Diante dessa experiência que tive hoje, refleti, e três sentimentos me vieram no coração, ambos juntos, sem conseguir fazer distinção de quais eram mais fortes. O primeiro é a alegria de conhecer um homem de verdade, humano, honesto e que tinha muita sabedoria para me ensinar, muito mais sabedoria que muitos livros que leio. O segundo foi de tristeza, pelo fato de saber que pessoas tão boas sofriam muito mais do que eu (um homem tão egoísta, falho, pecador). Terceiro, foi de rancor, por saber que eu estava impossibilitado de livrá-lo de suas necessidades financeiras, e de sua dor de dente, e enquanto isso muitos políticos desfrutam de uma gigantesca fortuna que conquistaram com o seu “muito esforço” de corrupção, assassinato e roubos. Então me veio no coração: Deus! Onde estás? Que não socorre homens como Júlio? E logo Sua voz soprou em meu coração dizendo: “vós sois o sal da terra […], e a luz do mundo” (Mateus 5.13–16). E também: “ame uns aos outros como eu vos amei, assim saberão que são meus discípulos” (João 13.34–35). Eu sou um cristão, e como cristão, preciso levar o Evangelho a esse homem, mas esse evangelho não significa apenas uma salvação espiritual, e sim, também, um socorro para suas necessidades. Podem me chamar de sensacionista, marxista, adepto da teologia da libertação, missão integral ou qualquer outra coisa… Não ligo! Minha preocupação está em Júlio, com sua dor de dente, e suas necessidades básicas para sobrevivência humana. Minha teologia é cristã, meus sentimentos precisam ser cristãos, minha fé é cristã.

Júlio me fez um pedido… Júlio é um bom zelador de fazenda, ou sítio, é um “caseiro”. Trabalhou a vida toda sendo zelador de áreas rurais. Ele precisa de um bom emprego nessa área. Pela idade que ele tem (creio ter uns 60 anos), o trabalho na roça é menos pesado para ele, pois já tem muita experiência na área — isso foi o que ele me disse.
Mas Júlio também precisa de tratar seus dentes, e se livra de suas dores… Eu não sei como fazer… Pois não tenho condições financeiras para custeá-lo. Que o Senhor direcione pessoas para me ajudar socorrer um de seus “pequeninos”, um que se chama Júlio.

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Leonan Féres, Goiânia, 07 de julho de 2017.



segunda-feira, 24 de abril de 2017

SÉRIE: TEOLOGIA BÍBLICA BASEADO EM GEERHARDUS VOS - "NATUREZA E MÉTODO DA TEOLOGIA BÍBLICA"



De acordo com a sua etimologia, teologia é a ciência concernente a Deus.[1] Frequentemente, alguns definem teologia como ciência da religião. Mas essa definição se encontra equivocada se o conceito de religião for entendido subjetivamente como a soma total dos fenômenos ou experiências religiosas no homem. Por que esse conceito se encontra equivocado partindo dessa perspectiva? Pelo fato desse dele já estar incluído na definição da ciência da antropologia que lida com a vida psíquica do homem, ou seja, terá haver com o homem e não com Deus. Além disso, se “religião for entendida, objetivamente, como a religião que é normal e de obrigação para o homem porque é prescrita por Deus, então outra questão deve ser levantada: por que Deus exige precisamente essa religião e não outra? Portanto, em última instância, ao lidar com religião nos encontraremos lidando com Deus”.[2]

A definição de teologia como ciência concernente a Deus implica na necessidade de basear-se em revelação. Diferentemente dos objetos impessoais, quando lidamos com um ser pessoal e espiritual (que é Deus) se torna impossível o manipularmos, darmos o primeiro passo, tornarmos ele um objeto passivo de pesquisa. Parte dele a iniciativa de se revelar a nós. Conforme ele se expõe podemos conhece-lo, mesmo assim, é impossível conhece-lo na sua totalidade. De acordo com Vos, “Ele é um ser infinitamente exaltado acima de nossa maior concepção”.[3] Ainda é importante abordar que antes de qualquer conhecimento exterior com relação a ele viesse a ser possível, ele teve que chamar a existência uma criatura, pois antes disso, originalmente, somente ele existia, “ele era conhecido somente de si mesmo”.[4]

Outro motivo da necessidade de revelação é o estado anormal do pecado em que o homem se encontra, esse estado o impossibilita do conhecimento da pessoa de Deus. Em razão a isso, toda iniciativa de tentar corrigir essa anormalidade parte soberanamente de Deus, não do homem, pois isso é impossível visto que tal se encontra morto, escravizado, totalmente mergulhado, submergido em densas águas e profundezas do pecado.

Podemos concluir então que teologia é a ciência concernente a Deus, e para que o homem o conhecesse foi necessário ele se revelar, tendo em vista que ele é um ser pessoal e espiritual, ainda agrava a anormalidade que o pecado causou na vida do homem o impossibilitando de ter reação e compreensão em relação ao conhecimento de Deus. Por isso foi necessário a revelação que parte soberanamente dele para que o conhecêssemos. A natureza e o método da teologia bíblica está baseada nessa revelação. 


Fonte bibliográfica:

[1] VOS, Geerhadus. Teologia Bíblica: Antigo e Novo Testamento. Tradução de Alberto Almeida de Paula. Cultura Cristã: São Paulo, 2010. p. 13.
[2] Ibid. p. 13. 
[3] Ibid. p.14. 
[4] Ibid. p.14.


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FÉRES, Leonan. Texto escrito no dia 24 de abril de 2017, em Goiânia, GO.



quarta-feira, 7 de dezembro de 2016

COMEMORANDO O NATAL NA VISÃO REFORMADA



Por esses dias, com o clima de natal no ar, procurei estudar um pouco mais sobre o assunto. Em uma de minhas pesquisas encontre um texto que afirmava com toda a convicção de que o natal deveria ser uma data guardada por todos os cristãos, e nesse texto o autor utilizava alguns símbolos de fé reformado. Em outros textos, vi pessoas contra a ideia a ponto de taxar do texto que citei. Mas, diante tudo isso pude compreender um pouco mais sobre os dois pontos de vista, vejamos então:

Visões reformadas que defendem a guarda do natal pelos cristãos

A primeira fonte que podemos observar é a Segunda Confissão Helvética. Essa Confissão foi um importantíssimo documento escrito pelo reformador protestante suíço Johann Heinrich Bullinger, que se tornou pastor da igreja de Zurique na Suíça em 1533 e foi um importante teólogo da Reforma Protestante. O historiador presbiteriano Alderi Souza de Matos, ao fala sobre essa Confissão, diz que:
“[...] vários colegas de diferentes cidades, escreveu a Primeira Confissão Helvética (1536), que se tornou a primeira declaração da fé reformada com autoridade nacional. A Segunda Confissão Helvética mantém a mesma estrutura, mas foi inteiramente redigida por Bullinger. Foi composta inicialmente após um parecer favorável do reformador Martin Bucer (1561), sendo reescrita durante uma epidemia na qual Bullinger julgou que iria morrer (1562). Ele anexou a confissão ao seu testamento como uma dádiva final à cidade de Zurique […] Posteriormente foi recebida na Escócia, Hungria, França, Polônia, Inglaterra e Holanda, tornando-se, ao lado do Catecismo de Heidelberg, o documento reformado mais estimado e influente”.[1]
Não há dúvidas de que a Segunda Confissão Helvética é um dos documentos mais importantes e influentes da história da teologia reformada, e nesta Confissão encontramos a seguinte informação:
24. Dos dias santos, dos jejuns e da escolha dos alimentos:
O tempo necessário para o culto. Embora não esteja a religião limitada pelo tempo, contudo não pode ser cultivada ou praticada sem distribuição e arranjo próprio do tempo. Toda igreja, portanto, escolhe determinado horário para as orações públicas, a pregação do Evangelho e a celebração dos sacramentos, não sendo permitido a ninguém transtornar esse horário da igreja a seu bel prazer. Pois, a não ser que algum tempo livre seja reservado ao exercício da religião, sem dúvida os homens absorvidos pelos seus negócios, estariam afastados dela.
O Dia do Senhor. Por isso vemos que nas igrejas antigas não havia apenas certas horas da semana destinadas às reuniões, mas que também o Dia do Senhor, desde o tempo dos apóstolos, fora separado para as mesmas, e para o santo repouso, prática essa, acertadamente preservada por nossas igrejas para fins de culto e serviço de amor. 
Superstição. Neste ponto, entretanto, não cedemos às observâncias dos judeus e às superstições. Pois, não cremos que um dia seja mais santo do que outro, nem pensamos que o repouso em si mesmo seja aceitável a Deus. Além disso, guardamos o Dia do Senhor, e não o sábado como livre observância. 
As festas de Cristo e dos santos. Ademais, se na liberdade cristã, as igrejas celebram de modo religioso a lembrança do nascimento do Senhor, a circuncisão, a paixão, a ressurreição e sua ascensão ao céu, bem como o envio do Espírito Santo sobre os discípulos, damos-lhes plena aprovação. Não aprovamos, contudo, as festas instituídas em honra de homens ou dos santos. Os dias santificados têm a ver com a primeira Tábua da Lei e só a Deus pertencem. Finalmente, os dias santificados, instituídos em honra dos santos, os quais abolimos, têm muito de absurdo e inútil, e não devem ser tolerados. Entretanto, confessamos que a lembrança dos santos, em hora e lugar apropriados, pode ser recomendada de modo aproveitável ao povo em sermões, e os seus santos exemplos, apresentados como dignos de serem imitados por todos.[2]
Está claro nesse documento, considerado um dos mais importantes da história da fé reformada, que a tradição reformada desde o princípio defendeu que os cristãos têm liberdade para comemorar o natal, ademais, se na liberdade cristã, as igrejas celebram de modo religioso a lembrança do nascimento do Senhor, é dada plena aprovação. O renomado historiador Phillip Schaeff escreveu sobre como o próprio Bullinger vivia essa liberdade com sua família: 
“A casa de Bullinger era um lar cristão feliz. Ele gostava de brincar com seus numerosos filhos e netos e de escrever pequenos versos para eles no Natal, como Lutero”.[3]

Depois da Segunda Confissão Helvética, vemos também a mesma liberdade no Sínodo de Dort, que deu origem aos famosos cinco pontos do calvinismo – popularmente conhecidos com TULIP. Além de refutar o arminianismo nos “Cânones de Dort”, o Sínodo também aprovou a “Ordem de Dort”. Neste documento, emitido pelo mesmo Sínodo que nos deu a TULIP, encontramos no artigo 67 ordens para que as igrejas da Holanda comemorassem o Natal, a Páscoa e o Pentecostes, vejamos:
“Além do Domingo, as congregações também observarão o Natal, a Páscoa e o Pentecostes”.[4]
No artigo 63, também encontramos referências às três festas: 
“A Ceia do Senhor será observada uma vez a cada dois meses, na medida do possível. Também é edificante, onde quer que as circunstâncias das igrejas permitam, que o mesmo aconteça na Páscoa, no Pentecostes e no Natal”.[5]

Visões reformadas que se opõem à guarda do natal pelos cristãos

Alguns teólogos que são contra a guarda do natal pelos cristãos, concordam que alguns ramos reformados não condenaram a observância de todos os dias santos instituídos pela Igreja Católica, e que essa posição aberta com relação à aplicação do princípio regulador ao calendário eclesiástico ocorreu especialmente nos Países Baixos, sendo registrada em dois símbolos de fé originários desta região (a Segunda Confissão Helvética e os Cânones de Dort), e embora elas não prescrevam, admitem a observância de vários dias do calendário cristão, incluindo os dias de nascimento, circuncisão, paixão, ressurreição e ascensão do Senhor e o dia de pentecostes, com base na ‘liberdade cristã. Mas utilizam Beza, uma das maiores figuras da Teologia Reformada, para ir contra essa posição:
“Quanto a outros dias de festas, nós os abolimos tanto quanto possível do nosso meio, especialmente aqueles introduzidos por meio de manifesta idolatria […] No entanto, porquanto há certas festividades instituídas desde tempos antigos, para a celebração de certos mistérios concernentes à redenção, usamos a liberdade cristã, e submetemos tudo para a edificação, de acordo com as diferentes circunstâncias de lugares, tempos e pessoas".[6]
Utilizam também alguns testemunhos confessionais como o Diretório para o Culto Público de Westminster:
“Na Bíblia não há nenhum Dia que seja ordenado para ser guardado como santo sob o Evangelho, senão o Dia do Senhor, que é o Sábado Cristão. Os dias de festa, comumente chamados de dias Santos, nã…o tendo base na Palavra de Deus, não devem ser continuados”.[7]

A assembleia geral da Igreja da Escócia do ano de 1575, que em uns dos artigos encontra-se o seguinte:
“Que todos os dias anteriormente denominados ‘santos’, além do dia do Senhor, como o Natal e outros, sejam abolidos, e que uma …penalidade civil seja imposta contra os que guardam tais cerimônias banqueteando, jejuando e com outras vaidades”.[8]

Já John Knox, reformador escocês, originador do presbiterianismo, diz que:
“Qualquer coisa que homens, por leis, concílios ou constituições têm imposto sobre as consciências dos homens, sem mandamento expresso da Palavra de Deus: tais como votos de castidade, promessas antecipadas [...] de casamento, imposição a homens e mulheres do uso de diversas vestes especiais, observância supersticiosa de dias de jejuns, abstinência de alimentos por motivo de consciência, oração pelos mortos, e a guarda de dias santos instituídos por homens, tais como todos aqueles que os papistas têm inventado, como as festas dos Apóstolos, Mártires, Virgens, Natal, Circuncisão, Epifania (Reis), Purificação e outras festas apreciadas por Nossa Senhora. Coisas estas que, não tendo nem mandamento nem garantia nas Escrituras de Deus, julgamos devam ser completamente abolidas do nosso Reino; declarando ainda, que obstinados observadores e ensinadores de tais abominações não devem escapar à punição do magistrado civil”.[9]
Por fim, é observável o que diz a IPB (Igreja Presbiteriana do Brasil) sobre o assunto no seu manual de princípios de liturgia, que reconhece apenas o dia do Senhor, o domingo, e os dias de jejum e ações de graças como observável. No artigo 1º, ele diz o seguinte:
“É dever de […] todos os homens lembrar-se do dia do Senhor (domingo) e preparar-se com antecedência para guardá-lo. todos os negócios temporais devem ser postos de parte e ordenados de tal sorte que não os impeçam de santificar o domingo pelo modo requerido nas Sagradas Escrituras”.[10]
Interessante é o que o documento diz no seu artigo 24:
“Sem o propósito de santificar de maneira particular qualquer outro dia que não seja o dia do Senhor, em casos muito excepcionais de calamidades públicas, como guerras, epidemias, terremotos, etc., é recomendável a observância de dia de jejum ou, cessadas tais calamidades, de ações de graças”.[11]
Enfim, podemos observar então duas posições opostas dentro da tradição reformada, ambos com base documental e com grandes referências da Teologia Reformada. Fica agora a avaliação de cada leitor, e o desafio para um estudo mais profundo sobre o assunto. Creio que assim como fui motivado a investigar mais a fundo sobre o tema, os leitores também serão depois de ler essas afirmações.


Notas:

[1] Portal Mackenzie: <http://www.mackenzie.br/7056.html>
[2] Confissão de Fé Helvética.
[3] Phillip Schaeff, History of the Christian Church, Volume VIII: “The Swiss Reformation”.
[4] Canônes de Dort.
[5] Ibid.
[6] Theodore Beza, The Christian Faith, trans. James Clark [East Sussex, England: Focus Christian Ministries Trust], 107-8.
[7] Diretório de Culto de Westminster. São Paulo: Os Puritanos, 2000. p. 66.
[8] Citado em Bryan Schwertley, The Regulative Principle of Worship and Christmas. Artigo extraído do site http://www.reformedonline.com/ em 25 de Novembro de 2010.
[9] Citado em Paulo Anglada, O Natal, o Culto e a Fé Reformada. p. 49.
[10] Princípios de Liturgia, in Manual Presbiteriano. São Paulo: Cultura Cristã, 2008. p. 143.
[11] Ibid.


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FÉRES, Leonan. 08 de dezembro de 2016, Goiânia, GO.



quinta-feira, 20 de outubro de 2016

AS REGRAS BÁSICAS DE HERMENÊUTICA BÍBLICA PARA A INTERPRETAÇÃO DAS ESCRITURAS



O primeiro texto que escrevi sobre hermenêutica bíblica foi específico para a leitura de textos poéticos nas Escrituras Sagradas. Agora nesse texto, com base em outro excelente livro sobre hermenêutica, a saber "O conhecimento das Escrituras" do Sproul, gostaria de abordar algumas regras básicas para a interpretação geral das Escrituras.

A primeira regra é a que a Bíblia deve ser lida como se lê qualquer outro livro. Isso não significa que é Bíblia é como qualquer outro livro, mas que ela deve ser lida como se lê qualquer outro livro. A Bíblia não é um livro alienado, e nem irracional, Ela é racional e contem um conteúdo a passar. Há um problema, muitos cristãos leem o jornal, revista e outros livros de forma racional, e quando vão ler a Bíblia parece que as coisas mudam, e a irracionalidade toma conta de sua mente, e o resultado disso é uma péssima interpretação do texto, sem levar em conta o contexto e a intensão do autor.

A segunda regra é ler a Bíblia de forma existencial. Quero dizer com isso, que devemos ler a Bíblia como se fôssemos um personagem que está assistindo ao vivo os fatos relatados no texto. Devemos sentir o texto, entrar na história.

A terceira regra é que as narrativas históricas devem ser interpretadas pelas passagens didáticas. Isso significa que devemos ficar atentos com um erro muito comum nos púlpitos, de criarem doutrinas ou princípios teológicos em cima de passagens históricas. Os textos didático sim têm autoridade para formular uma doutrina. Por isso é necessário um texto didático para interpretar o histórico.

A quarta regra é a de interpretar o implícito pelo explícito. Isso significa que há assuntos que são implícito, que não há uma afirmação explicita, e quando isso acontece devemos usar as passagens que são explícitas para sua melhor compreensão. Esse é um erro muito comum nas comunidades evangélicas. Há muitas doutrinas firmadas em deduções, e quando questionadas usam bases implícitas, sem nenhuma clareza.

A quinta regra é determinar cuidadosamente o significado das palavras. Os autores bíblicos escreveram a bíblia através de palavras, e essas palavras têm significados, têm sentidos. Não podemos ignorar esses sentidos no contexto em que foram escritos. Quando conhecemos esses significados podemos compreender melhor o todo do textos escritos na Bíblia.

A sexta regra é a observação dos paralelismos na Bíblia, pois o paralelismo nos apresenta ideias completas, e se negligenciarmos isso estaremos acrescentando ou ocultando algo do sentido do texto, e isso é desonesto à hermenêutica bíblica. Pra isso é preciso um bom material, no caso dos leigos algumas versões bíblicas que nos proporcionam uma separação dos paralelismo seria ideal para melhor interpretação do texto.

A sétima regra é saber diferenciar provérbios de leis. Sproul disse que um erro comum em interpretação e aplicação bíblica é dar ao provérbio a mesma força ou peso de um absoluto moral. Provérbios são dísticos pequenos e atraentes desenhados para expressar truísmos práticos. Refletem princípios de sabedoria para uma vida piedosa. Não refletem leis morais que devem ser aplicadas de forma absoluta a todas as possíveis situações da vida.[1]

A oitava regra é observar a diferença entre o espírito  e a letra da lei. Isso significa que devemos tomar muito cuidado com o legalismo que muitas vezes criamos em nosso coração ao ler as Escrituras, e isso pelo fato de não compreender a essência do texto, o lado espiritual da lei.

A nona regra é tomar muito cuidado com as parábolas. Devemos observar qual o propósito original da parábola. Entender o contexto e a intensão do contador. Elas não são tão simples, como muitos imaginam, elas são complexas se não compreendermos a história ou contexto em que o autor vivia no momento e o seu publico alvo.

A décima regra é o cuidado com as profecias de predições. Existem dois extremos que tomam conta da mentalidade de muitos cristão nos dias atuais; a primeira é o ceticismo a respeito das profecias de predições, não acreditando e dando uma enfase naturalista nas profecias tanto do Antigo, quanto do Novo Testamento; e a segunda é a desacerbada visão contemporâneo dessas profecias, que as enxergam em tudo o que acontecem hoje. Ambos são frutos de uma equivocada hermenêutica, pois precisamos ter em mente que tais profecias realmente aconteceram como ação de Deus na vida do seu povo, e algumas aconteceram ao pé da letra, como havia sido revelada, já outras têm um fim escatológico, e não necessariamente irá acontecer ao pé da letra. As profecias apocalípticas são repletas de figuras de linguagens, e por isso são mais complexas, pois é preciso um alto conhecimento da cultura dos receptores bíblicos (judeus) para entender o sentido e significado de tais profecias.

Essas são as regras básicas para uma boa interpretação bíblica segundo Sproul. Se atentarmos para cada regra com zelo, teremos que tirar um melhor tempo para a leitura das Escrituras, mas valerá a pena, pois assim, evitaremos um maior risco de impor sobre um texto algo que ele não está querendo dizer, muito menos ocultar sua verdade.


Nota bibliográfica

SPROUL, R.C. O conhecimento das Escrituras. Tradução de Heloísa Cavallari Ribeiro Martins. Cultura Cristã: São Paulo, 2003.


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FÉRES, Leonan. Texto escrito no dia 20/10/2016.



ALGUNS PRINCÍPIOS HERMENÊUTICOS PARA A INTERPRETAÇÃO DOS TEXTOS POÉTICOS



Há um crescimento no interesse de muitos cristãos em saber ler de forma adequada as Escrituras Sagradas, principalmente o Antigo Testamento, mas há um obstáculo: a falta de conhecimento na área da hermenêutica bíblica. Por isso, com base no livro "A Espiral Hermenêutica", de G.R. Osborne, venho expor alguns princípios básicos da hermenêutica para uma boa abordagem e interpretação nas passagens poéticas (com enfase nos salmos).

O primeiro princípio é a observação das estrofes do poema, ou do cântico. O elemento primário da poesia hebraica é o padrão de versos e estrofes paralelas.[1] É importante ficar atento ao desenvolvimento da ideia no salmo, pois assim descobriremos a quebra entre as estrofes. A maioria dos salmos (se não for dizer que todos) são formados por paralelismos, que era uma forma poética de um hebreu escrever. Para melhor compreensão desse primeiro princípio, aconselho lerem mais sobre os tipos de "paralelismos" da poesia hebraica.

O segundo princípio é agrupar os versos paralelos. O poeta escreve de forma poética, emotiva, e isso não pode ser ignorado. Por isso é importante saber agrupar os versos de acordo com a forma poética de um hebreu escrever. Se lermos o texto poético ignorando esse princípio corremos um grande risco de enxergar mais do que o salmista quis dizer no texto, ou acabar perdendo algo de suma importância. Pra isso indico o leitor adquirir uma Bíblia que já contenha as divisões das "linhas" (ideias completas) e cólos (subdivisão das ideias). Há algumas como a Bíblia de Jerusalém e NVI.

O terceiro princípio é atentar para a linguagem metafórica. Esse princípio também não pode ser ignorado pelo fato da poesia ter a linguagem figurada mais evidente no seu todo.

O quarto princípio é observar o pano de fundo histórico do salmo. Normalmente, nas nossas traduções bíblicas, em quase todas as versões, temos os títulos antes de cada salmo, isso facilita o cumprimento desse princípio. É o saber o contexto, como, quem e quando o salmo foi escrito.

O quinto princípio é respeitar o tipo de salmo em que está lendo. Há diversos tipos de salmos. Alguns são de adoração, outros lamentação, outros gratidão e etc. Ambos são diferentes uns dos outros, não iremos compreender um salmo de lamentação se o lermos como se fosse de gratidão. Por isso é preciso saber o tipo de salmos que estamos estudando.

O sexto princípio é estudar os salmos messiânicos, primeiramente, com o seu propósito histórico antes do seu significado escatológico.

O sétimo e ultimo princípio a ser abordado é estudar o salmo como um todo antes de tirar nossas próprias conclusões. O fluxo de ideias no salmo é crucial para o seu significado.[2]


Notas bibliográfica

[1] OSBORNE, Grant R. A Espiral Hermenêutica: uma nova abordagem à interpretação bíblica. Tradução de Daniel de Oliveira, Robinson N. Malkomes, Sueli da Silva Saraiva. Vida Nova: São Paulo, 2012. p. 305.
[2] Ibid, p. 308.


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FÉRES, Leonan. Texto escrito no dia 20/10/2016.



terça-feira, 18 de outubro de 2016

O CONHECIMENTO DO SER DE DEUS



Antes de tudo, gostaria de quebrar certos pré-conceitos que alguns cristãos têm a respeito da Teologia. Eles acreditam que teologia é a ciência que estuda Deus com base nas ideias de homens religiosos, e isso não é correto. Teologia é o estudo de Deus com base nas revelações que Ele nos deu através da natureza, da história e principalmente na revelação especial, a saber, as Sagradas Escrituras (Bíblia). Percebe-se que que toda a base da teologia está na revelação, e não simplesmente em ideias humanas.

Entendendo tudo isso podemos começar a discutir sobre o Ser de Deus. O que as Escrituras nos revelam é que há um único Deus, Ele é singular, único, não há outros deuses, isso demonstra sua absolutividade. Isso é indiscutível nas Escrituras, ela está repleta de textos que nos revelam isso: Dt 6.4; 1 Rs 8.60; Is 37.16; 1 Co 8.4; Gl 3.20; Ef 4.6. E muitos outros textos.

Existe outra coisa que precisamos entender a respeito de Deus, Ele nos revela nas Escrituras que é um Deus Transcendente e Imanente, isso é chamado de Teísmo. Transcendência é o fato de Deus está acima de toda a criação, e sobre ela (Is 55.8-9). A Imanência é o fato de Deus se relacionar com essa criação (Sl 104.27-34).

Só que, como sempre, devemos tomar cuidado com os extremismos. Existe um grande perigo quando há uma enfatização em uma das duas características mais que a outra. Deve haver um equilíbrio pois quando enfatizamos mais a imanência do que a transcendência, caímos no erro do Panteísmo, que identifica Deus com o mundo. O panteísmo afirma que o mundo é uma extensão de Deus, e Ele então passa a possuir uma substância física. A energia física presente no mundo é Deus, que veio a ser identificado com o mundo físico. Quando se aceita um Deus assim, ele perde a sua própria personalidade, manifestando-se na existência de todas as coisas. [1] E quando enfatizamos mais a transcendência do que a imanência, acabamos caindo no erro do Deísmo, que creem em um Deus distante e sem qualquer relacionamento com o mundo criado, negando a doutrina da providência divina ou a doutrina da revelação geral. [2] Um dos teólogos mais conhecidos dessa linha filosófica é Kierkegaard e Karl Barth. O que se pode responder às suas afirmações? Tenho em mente apenas uma pergunta a fazer-lhes: Se Deus é tão distante assim, como Barth pode falar dele? [3]

Percebe-se que há um equilíbrio entre essas duas características de Deus, sua transcendência e imanência em algumas passagens bíblicas: Isaías 6.1-5; 57.15; Sl 113.5-7; Jo 8.23 (Jesus está presente falando de sua transcendência).

O único modo de conhecer a Deus é através do estudo de seu caráter conforme nos foi revelado nas Escrituras, e esse caráter deve ser considerado um padrão para a moralidade humana, pois a falta desse conhecimento leva à imoralidade destrutiva e ao relativismo diabólico que foi plantado nos ideias pós-moderno. Por isso é de extrema importância o estudo do Ser de Deus, para que nós e nossos filhos sejamos influenciados a vivermos conforme o caráter de Deus. Há alguns benefícios evidentes para a vida do crente quando ele conhece mais a fundo o caráter de Deus, como o desfrutar de um melhor relacionamento com Ele, entender e viver o que realmente é um culto diante dele, melhorar nossa adoração comunitária e nos faz enxergar melhor o universo e a perspectiva de vida, compreendendo com mais tranquilidade o agir de Deus no mundo.

Aconselho aos leitores uma melhor dedicação ao estudo do tema, pra isso indico bons livros de teologia sistemática que abordam não só este assunto, mas vários outros para o nosso crescimento intelectual a respeito da fé cristã. Esses livros são: Teologia Sistemática de Louis Berkhof, Manual de Doutrina Cristã de Louis Berkhof, Teologia Sistemática de Charles Hodge, O Ser de Deus de Heber Carlos de Campos, Teologia Puritana de Joel R. Beeke, Criados à Imagem de Deus de Anthony Hoekema, e As Institutas da Religião Cristã de João Calvino. Boa leitura!


Notas bibliográficas:

[1] CAMPOS, Heber Carlos. O ser de Deus. 3º Ed. Cultura Cristã: São Paulo, 2012. p. 16.
[2] Ibid. p. 20.
[3] Ibid. p. 19.


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FÉRES, Leonan. Texto escrito no dia 18/10/2016.



segunda-feira, 17 de outubro de 2016

BREVE ANÁLISE SOBRE O BATISMO POR ASPERSÃO


O objetivo dessa análise não é argumentar contra o imersionismo, muito menos ensinar que a prática no meio cristão é errada. O que pretendo é apenas mostrar que o batismo por aspersão não é contrário a Bíblia nem mesmo à história do cristianismo, como muitos imersionista defendem. Por isso terei que refutar alguns argumentos que afirmam ser equivocado o batismo por aspersão.

É de se admirar que em meio a muitos cristãos protestantes reformados, surgem alguns com o questionamento sobre o assunto. Por isso preparei essa breve análise para que os queridos irmãos tenham algumas de suas dúvidas esclarecidas. Lembrando que esse não é um estudo muito aprofundado, infelizmente não tenho tanto material disponível em minha biblioteca nem mesmo patente superior no assunto para preparar algo com mais exatidão, mas o básico do assunto será exposto aqui. Boa leitura!

1. Argumentos teológicos

Há um argumento imersionista que diz: "o batismo precisa ser por imersão porque o indivíduo é lavado dos seus pecados naquele exato momento". Há um problema nesse argumento, pois a Palavra de Deus na carta aos Hebreus é muito clara no que diz: "quase tudo se purifica com sangue. E, sem derramamento de sangue não há remissão de pecados" (Hb 9.20-22). Portanto não é a água, muito menos a sua quantidade que nos proporciona o purificar do pecado, mas sim o sangue do Cordeiro que foi derramado no madeiro, a saber o sangue de Jesus. 

Depois, podemos encontrar alguns textos no Antigo e Novo Testamento onde a palavra "aspersão" ou "aspergir" aparecem num sentido de rito de purificação. Analisemos: Ex 24.8; Lv 14.16; Ez 36.25; 43.18; Mc 7.4; Hb 9.13, 21; 12.24 e 1 Pe 1 e 2. Podemos ver então que em tais ritos de purificação é usado a palavra "aspergir" e não "imergir". Isso nos leva a entender que não é a ação de imergir que irá nos purificar do pecado, pois não há a palavra "imersão" em tais textos citados que estão num sentido de purificação.

Quando Cristo nos dá a ordem de fazermos discípulos e batizá-los, Ele ordena a cumprir o rito do batismo, mas não há nenhuma orientação na forma em que devemos realizá-lo. Por isso é incoerente da parte de alguém impor uma forma de batismo e definí-la como uma verdade bíblica incontestável, sendo que não existe uma afirmação de como deve ser feita. É muito triste a intolerância de algumas instituições eclesiásticas a respeito desse assunto, pois não respeitam a forma de batismo por aspersão impondo um novo batismo sobre os novos comungantes.

Enfim, a Bíblia é clara nesse assunto: Não é a água quem purifica, mas sim o sangue de Cristo. A forma de imersão não é a verdade bíblica para o batismo e nem purificação, pois vemos que a Bíblia está repleta de textos que trazem a palavra "aspergir" como sinal de purificação. Por esse motivo e também por Cristo não definir uma forma única de batismo não podemos desprezar o batismo por aspersão, imersão e nem mesmo o de efusão. Ambos têm o mesmo significado, e isso é o que importa. Sejamos mais tolerantes!

Referências bíblicas para a defesa do batismo por aspersão

Em um artigo teológico o Rev. Guilhermino Cunha diz algo interessante que devemos acrescentar em nosso pensamento sobre o assunto: "Sob a aspecto linguístico Baptus e Baptizw significam também imergir, mas não somente. Na Bíblia, os termos Baptw e Baptizw (Batizar e Batismo) são mais usados como aspergir, do que como imergir". Citarei alguns textos em meio a muitos que comprovam isso:

Mateus 3.11 - "Ele vos batizará com Espírito Santo e fogo". Vejamos que a todo momento, quando o Espírito Santo se manifesta para o cumprimento dessa promessa Ele vem "sobre" o indivíduo, como por exemplo o batismo de Jesus, onde o Espírito Santo veio "sobre" ele em forma de pomba (Mt 3.16). Ou então as línguas de fogo que vieram "sobre" os crentes que comemoravam o pentecoste (Atos 2.3-4). Enfim, "batizar" aqui está no sentido de "aspergir".

Em 1 Coríntios 10.2, Paulo diz: "Tendo sido batizados  na nuvem como no mar". Aqui o termo grego é "Ebaptizantw", que só pode significar que foram aspergidos pela nuvem (pois todos sabem que ali ninguém mergulhou na nuvem) e foram borrifados pela água do Mar Vermelho (uma vez que o povo passou a pé enxutos pelo meio do mar).

Um outro texto polêmico é o de Atos 9.18, que diz: "A seguir, levantou-se e foi batizado". Primeiramente observe que ele se "levantou" para ser "batizado". Sem dizer também que ele foi batizado "dentro" da "casa de Judas". Acho um pouco difícil haver um rio, mar ou até mesmo uma banheira de luxo que caberia Paulo e Ananias (quem o batizou) juntos para o evento.

Assim como Paulo, o carcereiro de Felipo, juntamente com sua família foram batizados dentro de sua própria casa (At 16.33), isso nos leva a entender que tais batismo foram por aspersão, a inferência é clara.

Enfim, existem outros vários textos que nos revelam o sentido de aspersão no batismo, mas acredito ser o suficiente para entendermos que existe sim o batismo por aspersão na Bíblia, e que tal modo de batismo não é apenas um evento raro, mas sim comum.

Argumento histórico

O Didaquê, um documento muito antigo, que foi escrito por volta do fim do primeiro século e início do segundo, no seu cap. VII diz que "o batismo deve ser feito com água pura, podendo ser aspergida sobre o batizando três vezes, em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo". 

Mais uma evidencia histórica de que o batismo por aspersão era uma prática comum no cristianismo primitivo é que nas catacumbas de Roma, e nos afrescos e entalhes de Nazaré revelam Cristo sendo batizado por João Batista, onde João derrama água "sobre" a cabeça dele. Ou seja, os cristãos primitivos deixam rastros históricos, aos quais nos revelam que o aspersionismo não era algo fora de cogitação, pelo contrário era visto como algo comum. 

Podemos conhecer outros vários argumentos históricos que comprovam que os cristãos primitivos batizavam por aspersão e não por imersão. Tenho certeza que se vasculharmos os pais da igreja iremos encontrar algo sobre o assunto. Mas enfim, ficarei apenas com esses dois que ao meu ponto de vista já são convincentes, para não estendermos mais esse pequeno estudo. Se alguém quiser se aprofundar mais no sentido histórico do batismo, aconselho ler sobre os Anabatistas e a sua confissão de fé conhecida como "Confissão de Fé de Schleitheim", que surgiu no ano de 1527, tal documento poderá levá-los a entender melhor o surgimento do imersionismo.

Nesse ponto podemos concluir que na história do cristianismo não há nada que condene o batismo por aspersão, pelo contrário, há provas concretas de que essa era uma prática comum no meio dos cristãos primitivos.

Razões práticas para batizar por aspersão

Acredito que o imersionismo se tornaria até mesmo complexo quando os imersionistas se deparam com algumas situações complicadas, como por exemplo, quando alguém que está em fase terminal num hospital decide ser batizado, e o indivíduo está impossibilitado de se levantar da cama. Seria muito difícil o enfermo ser batizado por imersão. Por outro lado sei que o batismo por aspersão não encontrará problemas com isso, por isso tal batismo é mais prático.

Outra observação que tenho a fazer é que seria até mesmo anti-higiênico tal batismo, pelo motivo que todo ser humano tem corrimentos e secreções por todo seu corpo, sem falar em doenças e problemas de pele. Enfim, mergulhar várias pessoas num único lugar se tornaria, além de nojento, problemático para a saúde de alguns. A não ser que o batismo ocorra em água corrente, onde possivelmente tais problemas possam ser evitados.

Nesse sentido vemos também que o batismo por aspersão tem suas vantagens e não são poucas. Ele é mais prático, pode ocorrer em qualquer lugar, com qualquer pessoa independentemente de seu estado de saúde e também é mais higiênico.

Conclusão

Podemos concluir essa breve análise dizendo que o batismo é uma ordem de Deus, onde a forma não é o que conta e sim o significado, pois a forma é apenas um sinal externo. O importante é a graça de Deus que é aplicada pelo Espírito Santo no coração do pecador que se arrepende. É o sangue do cordeiro que foi derramado em nosso favor (1 Jo.7-9). Portanto o que é necessário é a água, e não a quantidade de tal, pois se fosse o contrário seria mais justo batizar os indivíduos no oceano Atlântico. Espero ter sido claro que ambas formas de batizar são válidas, e o que espero de todos os cristãos que lerem esse texto é que sejam tolerantes uns com os outros, respeitando a forma em que ambos foram batizados, lembrando que o importante é o significado do batismo e o sangue de Cristo que nos purifica do pecado. Que Deus abençoe a cada leitor! 


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FÉRES, Leonan. Texto atualizado em 17/10/2016.